Em um cenário de tensão global, onde a guerra na Ucrânia desencadeou uma crise de petróleo e gás nos países europeus, o Brasil desponta como um país mais independente na questão energética, considerando ainda o fato de termos a matriz mais limpa entre todos os países do BRICS.
Na visão de José Goldemberg, ex-ministro da Educação e professor do Instituto de Energia e Ambiente da Universidade de São Paulo (USP), a crise causada pela guerra Rússia x Ucrânia não afeta tanto o Brasil, já que o país depende pouco de gás como fonte energética, é autossuficiente - com 50% da matriz energética renovável (hidrelétrica, eólica e solar).
Para o especialista, as incertezas com o fornecimento de petróleo e gás e a flutuação dos preços estão levando os países a um novo ‘nacionalismo energético’ na tentativa de reduzir sua dependência das importações.
“É nesse contexto que as energias renováveis contribuem, tendência da qual o Brasil está à frente da Europa. Uma das soluções para mantermos o avanço no país é expandir as fontes renováveis como hidrelétricas, eólicas e solares, além de exportar produtos da biomassa”, finaliza Goldemberg.
O ex-ministro, que foi citado como precursor do etanol no Brasil como alternativa à crise do petróleo da década de 1970 no livro “O Petróleo”, de Yergin, explica que trazer o tema para discussões no momento é crucial para que não haja retrocesso no país, já que existem grupos econômicos nacionais interessados em expandir o gás como fonte de energia, o que aumentaria a dependência do exterior.
“Yergin foi quem deixou claro que a década de 1970 não seria o fim do petróleo. Nessa nova obra, o especialista aborda efeitos da guerra da Ucrânia e as energias alternativas, uma contribuição essencial para a adoção de políticas energéticas corretas”.
Confira 5 tendências elencadas por Goldemberg para o Brasil nos próximos anos:
1 – Investir em fontes solares e eólicas é primordial: Tendo em vista que as fontes de energias renováveis representarão 60% até 2050 no mundo, segundo relatório da BP sobre perspectiva energética, e terão capacidade de abastecer 80% da demanda mundial, de acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), investir nessas matrizes deve ser prioridade. A desvantagem das fontes solares e eólicas é serem intermitentes (não havendo sol à noite e vento o tempo inteiro, por exemplo). Por esse motivo, é preciso que elas sejam complementadas com outra fonte de energia renovável: as hidrelétricas, o melhor dos reservatórios de energia, muito superior ao uso de baterias.
2 – Expansão das hidrelétricas: a energia vinda desta fonte continuará a dominar a geração de eletricidade no Brasil, com o equivalente a 58% da matriz do país até 2030, segundo último relatório GolbalData, de 2021. Além de ser uma fonte viável e renovável de energia, tem potencial de expansão no Brasil se os cuidados com o meio ambiente forem tomados, evitando problemas como em Belo Monte.
3 – Inversão da lógica do petróleo: o país não utiliza petróleo, gás e carvão para gerar eletricidade como os países da Europa, mas um dos principais problemas se dá em relação ao uso do petróleo como matéria-prima para a produção de óleo diesel e gasolina. Apesar ser autossuficiente na produção de petróleo, o país não investe como deveria em refinarias, o que gera a necessidade de exportar o produto bruto e importar a gasolina, deixando os preços dependentes do dólar. Com mais refinarias, o país teria autonomia no controle dos preços, o que impactaria drasticamente nos valores dos produtos que dependem do transporte rodoviário, incluindo alimentos.
4 – Exportação de etanol: como fonte de combustível renovável, o etanol continua sendo uma boa opção para substituir a gasolina. Como sua matéria-prima é a cana-de-açúcar, que não pode ser cultivada em muitos lugares do mundo, seria uma boa oportunidade de exportação para o Brasil.
5 – Implementação eficaz de ferrovias: como somos totalmente dependentes do petróleo para o transporte, via o uso de automóveis e caminhões, seria importante que houvesse um plano de implementação e expansão de ferrovias no país para diminuir o consumo de gasolina e diesel para baratear o custo de transporte de pessoas e mercadorias, sobretudo “commodities” como soja.
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